Especialistas ouvidos pelo g1 explicam que uma série de fatores internos e externos devem fazer com que a economia brasileira passe por uma desaceleração neste ano.
Foto ilustrativa de cédulas de real Marcos Santos/USP Imagens O Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil cresceu 3,4% em 2024, informou o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) na sexta-feira (7).
O resultado, impulsionado pelos setores de serviços e indústria, surpreendeu os agentes do mercado financeiro, que previam um crescimento maior, de 4,1%. Para 2025, no entanto, as expectativas não começaram otimistas.
O Focus da última quarta-feira (5) mostra que o mercado projeta um crescimento do PIB de 2,01% em 2025.
Na primeira semana do ano, a projeção era de alta de 2,02%. Os analistas esperam que a economia brasileira passe por uma desaceleração em 2025, impulsionada por uma série de fatores macroeconômicos e internacionais.
(Veja mais abaixo) Além disso, a leitura é que a atual política de gasto público do governo também pode acabar comprometendo um resultado mais sustentável da economia.
A política fiscal, dizem, é o maior desafio.
(veja no vídeo abaixo) Especialistas afirmam que atual política de gasto público do governo pode comprometer resultado sustentável da economia Leia mais: Especialistas afirmam que atual política de gasto público do governo pode comprometer resultado sustentável da economia Diante desse cenário, o g1 perguntou a quatro especialistas quais são os principais riscos para a atividade econômica do país.
São eles: Os gastos do governo; Taxas de juros elevadas e em tendência de alta; Novas tarifas de Donald Trump. Gastos do governo Segundo economistas, fatores como as reformas econômicas dos últimos anos e o mercado de trabalho aquecido ajudaram a impulsionar a atividade do Brasil em 2024, mas uma parte importante desse cenário é explicada pelos estímulos fiscais. Isso porque, nos últimos anos, os gastos extras feitos pelo governo nos últimos anos para injetar dinheiro na economia até ajudaram a trazer um crescimento do PIB, impulsionando o consumo.
Foi o caso das facilitações de crédito para empreendedores e o programa Pé-de-Meia, por exemplo. E até mesmo o próprio IBGE destaca o papel dos estímulos fiscais no crescimento do PIB.
Além do mercado de trabalho aquecido, o Instituto também atribui o forte consumo das famílias aos incentivos do governo ao longo do ano. Os especialistas alertam, no entanto, que já não há mais espaço nas contas públicas para novos estímulos fiscais, em meio ao déficit bilionário do governo e a alta dívida do setor público.
Neste ano, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, chegou até a anunciar um pacote de corte de gastos, com o objetivo de economizar R$ 327 bilhões em cinco anos e equilibrar o quadro fiscal.
Assim, a leitura é que esse cenário deve desacelerar a economia.
Primeiro porque, como explica o economista da XP Investimento, Rodolfo Margato, a tendência é que haja uma acomodação da atividade ao seu "potencial natural", uma vez que o governo deve parar de injetar quantias expressivas de dinheiro na mão da população. Além disso, também há um esforço contínuo do Banco Central do Brasil (BC) de controlar a pressão inflacionária no país causada pelos últimos estímulos fiscais, que acabaram elevando o consumo.
A indicação é que os juros devem ficar ainda mais altos ao longo deste ano, o que também deve frear a atividade econômica.
"O BC está trabalhando para tentar conter a inflação, mas a política fiscal não está conseguindo ajudar.
Pelo contrário, está fazendo papel de aumentar mais o gasto, e isso está atrapalhando o trabalho da instituição", afirma Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados. Taxas de juros elevadas e em tendência de alta A junção de um mercado de trabalho aquecido e estímulos fiscais gera o receio nos economistas de que a economia brasileira esteja trabalhando acima de sua capacidade, o que provoca inflação. Antônio da Luz, economista da Ecoagro, faz uma analogia com os esportes para explicar o problema de estimular demais a economia: "Se um personal passa um treino para um aluno para desenvolver o físico, mas esse aluno começa a usar muitos anabolizantes, o corpo até pode parecer ideal e muito rápido, mas um exame de sangue vai mostrar que há algo errado". Um exemplo prático dessa situação na economia é a inflação de serviços.
Até janeiro, o núcleo da inflação de serviços (que exclui itens voláteis, como passagens aéreas) acumulava uma alta anual de 5,9%, mais do que a inflação oficial, que acumulou 4,56%, mostra levantamento da Monte Bravo. O setor de serviços é um dos primeiros a refletir um hiato do produto positivo — ou seja, quando a demanda por bens e serviços é maior do que a capacidade produtiva do país.
Isso porque este é um setor que depende, essencialmente, da mão-de-obra.
Com maior demanda por profissionais (como garçons, recepcionistas e cabelereiros, por exemplo), mais caro fica para contratar mais pessoal. Além disso, em 2025, também pesam novos fatores externos, como a alta do dólar por conta da expectativa de juros maiores nos Estados Unidos.
(entenda mais detalhes abaixo) A inflação anual teve alta de 4,86% em 2024.
Segundo o Focus, deve chegar a 5,65% ao término de 2025.
Por isso, o Comitê de Política Monetária (Copom) do BC está em meio a um ciclo de altas da taxa básica de juros desde setembro.
Foram quatro altas seguidas, levando os juros a 13,25% ao ano.
A expectativa é de que a Selic chegue a 15% em 2025. Juros altos são a forma que o Copom tem de conter a inflação, porque encarecem a tomada de crédito e processos de financiamento, reduzindo o consumo das famílias.
Esse processo, porém, leva algum tempo, já que cada mexida na taxa de juros demora de seis a nove meses para atingir a economia real. O que se espera é que os efeitos dos juros mais altos só comecem a ser sentidos pelos brasileiros em meados deste ano, sobretudo no segundo semestre, afirma Luz.
Novas tarifas de Trump O exterior também promete trazer problemas para a economia brasileira nos próximos anos.
O principal risco vem de Donald Trump, novo presidente dos EUA. Desde que voltou à Casa Branca, Trump adotou uma postura de priorizar a produção interna dos EUA em detrimento das importações, cumprindo uma de suas promessas de campanha de tarifar parceiros comerciais. Josenito Oliveira, professor de economia da Universidade Tiradentes, diz que estratégia serve como forma de obter vantagem em negociações internacionais, ameaçando os acordos comerciais.
Mas, levando as medidas à frente, há risco de encarecimto dos preços dos insumos e de produtos prontos que chegam aos EUA, tornando-os mais caros. Isso pode gerar mais inflação no país, que já luta para reduzir seus índices de preços.
Em janeiro, a inflação anual americana chegou a 3%, acima da meta de 2% do Federal Reserve (Fed, o banco central americano). A situação pode levar o Fed a promover novas altas nas taxas de juros, que estão entre 4,25% e 4,50% ao ano.
Juros mais altos nos EUA elevam a rentabilidade dos títulos públicos do país, considerados os mais seguros do mundo, e atraem mais investidores para o país, fortalecendo o dólar. Um dólar elevado encarece tudo no Brasil, pois muitos produtos são importados ou têm insumos importados, gerando mais pressão inflacionária.
Isso, por fim, pode prolongar o ciclo de juros elevados no Brasil, pesando sobre o consumo das famílias e o PIB. Só em 2024, o dólar já subiu mais de 20%, e apesar de recuar um pouco nos primeiros meses deste ano, continua com a cotação elevada.
Isso já impactou nos preços de diversas cadeias produtivas, como itens de saúde e produtos de tecnologia.
Se voltar a subir mais, a moeda pode pesar sobre a economia brasileira. Por enquanto, tudo o que partir do México, Canadá e China será taxado nos EUA, e há uma ameaça de que a medida se estenda à União Europeia.
Novas tarifas também foram impostas sobre madeira, produtos florestais e automóveis, além de aço e alumínio, que o Brasil exporta para lá.